sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

E lá vem o futuro...


RECEITA DE ANO NOVO

Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor do arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido).
Para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior).
Novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha.
Não precisa
fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar arrependido
pelas besteiras consumadas
nem acreditar
que por decreto de esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo recompensa,
justiça entre os homens e as nações.
Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre!


(Carlos Drummond)

Johnny Cash

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

domingo, 9 de novembro de 2008

Maria Lacerda de Moura

Guerra ao analfabetismo, sim, porém, guerra sem tréguas à ignorância presumida, à tibieza de caráter; ao orgulho tolo, à vaidade vulgar, à pretenão, à ambição pessoal, ao egoísmo sórdido, à intolerância, ao sectarismo absorvente, aos preconceitos de uma civilização que desmorona, em suma: guerra à mediocridade, à vulgaridade e à prepotência assegurada pela autoridade do diploma, do bacharelato incompetente, nulo e jactancioso.
(Lacerda de Moura, Maria. Lições de Pedagogia, 1925, p. 76)

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

"Tout ce que je sais du monde, même par science je le sais à partir d'ume vue mienne ou d'une experience du monde sans laquelle les symboles de la science ne voudraient rien dire"

M. Merleau Ponty - Phénoménologie de la Perception

(Todo meu conhecimento, mesmo que científico, se constrói a partir de uma visão minha ou de uma experiência do mundo sem a qual os símbolos da ciência nada significariam.)

quarta-feira, 30 de julho de 2008

Mulher, simplesmente... Mulher

Dona Maria - Uma brasileira!
Augustinópolis - Tocantins - Brasil

Um brasileiro do norte

Seu Quincas - Um "cabra" esperto!
Augustinópolis - Tocantins - Brasil

terça-feira, 29 de julho de 2008

Uma foto!

Ponte em construção sobre o Rio Tocantins - Ligando os estados do Maranhão e Tocantins.
Imperatriz/MA

domingo, 27 de julho de 2008

Luta na Terra de Makunaima - O Drama da Reserva Raposa Serra do Sol

São as eleições, cretino!


De novo, estamos, queiramos ou não, às voltas com eleições municipais. Particularmente, não gosto do instante, não me sinto envolvido, não vejo qualquer brilho ou convite. Pelo nível dos argumentos, das propostas e das intervenções, digo sem qualquer medo de errar que é a própria esterilidade de um tempo político.
Neste pedaço de cerrado chamado Goiânia a coisa é um pouco mais dramática.
A vitória do "denossauro" Iris Rezende é iminente. Fruto, também, e é claro, da excepcional contribuição do Partido dos Trabalhadores (ou pelo menos do que restou dele!). Fico me perguntado como um partido como o PT, se perverte de tal forma.
Não, não é só porque se ajoelha de forma tão servil aos projetos do coronelato e do neo-coronelato de Goiás o que se escancara na espúria "aliança" com o stablishment da direita goiana.
Apressado e com a ligeireza dos desesperados, o PT lembra um náufrago e que se agarra a sua tábua. Ocorre que, mal sabe o PT, mas a tábua é oca e bem oca.
Outro problema, não mais para o PT, é a HISTÓRIA.
A "maldita" HISTÓRIA.
O diabo é querer negar a própria história feita a ferro e fogo sobre lombo escravo, indígena e popular. É querer negar séculos de dominação. A destruição do cerrado e do seu muito fecundo bioma pelos empreendimentos pastoris ou da mineração. A dizimação, ainda em curso, de centenas de comunidades indígenas. A submissão dos movimentos sociais e populares de construção de novo cariz ecológico e ambiental.
Como é possível? Como se faz isso? Simples... Basta ser do PT!

Bom... Outra dica importante é que fascistas e imbecis são muito bons nesse tipo de maquinação.
O PT? O PT-Goiânia inaugura um novo "ser político". Na verdade não sei bem categorizar que "bicho" é esse. Talvez uma mistura de fascismo de paróquia com a imbecilidade dos apressados que não conseguem pensar um "fazer político" diferenciado e que, portanto, se lançam cegos e sedentos nas alcovas do poder. Some-se a isso o oportunismo advindo dos fracassados da história e que, simplesmente, se cansaram de sonhar uma sociedade de iguais. Eis a mistura e que a ciência política atual ainda não conseguiu diagnosticar.
Sinceramente... Eu diria que estamos fritos!

terça-feira, 24 de junho de 2008

quarta-feira, 18 de junho de 2008

EDGAR RODRIGUES: UMA CURTA BIOGRAFIA

Pesquisador de história social, nascido em Angeiras, conselho de Matosinhos e naturalizado brasileiro.

Filho de militante anarco-sindicalista português do Sindicato da Construção Civil, filiado à Confederação Geral do trabalho (CGT), preso pela PIDE-serviço secreto do governo salazarento, em conseqüência de sua militância sindical, participou desde jovem da luta contra a ditadura de Salazar, tendo-se exilado no Brasil em 1951. No Rio de janeiro relacionou-se com os velhos militantes anarkistas, entre os quais José Oiticica e Edgard Leuenroth, participando das atividades do movimento e colaborando regularmente na imprensa libertária, adotando, desde então, o pseudônimo de Edgar Rodrigues.

Seus primeiros livros: “Na Inquisição de Salazar” (Rio de Janeiro, 1957) e “A Fome em Portugal” (Rio de janeiro, 1958) foram de denúncia da ditadura portuguesa, o que lhe valeu integrar a lista dos autores proibidos em Portugal, onde só pode voltar após a derrubada do regime autoritário em 1974.

Também nos seus números artigos publicados nas décadas de 60 e 70, em jornais e revistas da Europa e da América Latina, tiveram como um dos temas mais constantes a denuncia da ditadura portuguesa. Participou ainda ativamente de inúmeros atos e movimentos de opinião realizados no Brasil em solidariedade aos presos políticos portugueses.

Sempre trabalhou, desde sua chegada ao Brasil, como operário da construção civil. Apesar das dificuldades e da vida rude continuou seus trabalhos de pesquisa, que iniciados com o trabalho “Na Inquisição de Salazar”, abriram-lhe as portas para documentar o próprio movimento social do Brasil, dentro de uma óptica libertária, em especial o movimento sindical libertário. Colaborou com o Jornal AÇÃO DIRETA, editado pelo professor Oiticica, e após a morte deste ajudou na reativação e continuidade do CEPJO (Centro de Estudos Professor José Oiticica) – onde, na década de 60 se reunia o MLE (Movimento Libertário Estudantil – no qual o jovem Edson Luis Lima Souto militava – até ser assassinado em 68, pela polícia, no Calabouço).

A pedido de publicações libertárias no Uruguai começa a pesquisar e se dedicar a história do movimento social no Brasil escrevendo dezenas de livros e artigos sobre o assunto. Seus livros “Socialismo e Sindicalismo no Brasil”, “Nacionalismo e Cultura Social”, “Novos Rumos” e “Alvorada Operária” são uma das principais fontes documentais do movimento operário e do anarkismo no Brasil. Da mesa forma é autor de quatro livros sobre a história do movimento operário em Portugal: “O Despertar Operário em Portugal (1834-1911)”, “Os Anarkistas e os Sindicatos (1911-1922)”, “A Resistência Anarko-Sindicalista (1922-1939)” e “A Oposição Libertária à Ditadura (1939-1974)”. Seus trabalhos são um manancial de informação para os pesquisadores da história social do Brasil e Portugal, podendo-se afirmar que foi um precursor no estudo do movimento operário no Brasil, como foi publicamente reconhecido por pesquisadores como Hélio Silva, Azis Simão e Foot Hardman. Apesar de ser um pesquisador auto-didata seus trabalhos são reconhecidos como uma fonte inestimável, e citados por historiadores tão distintos como Foster Dulles, Eric Hobbsbawn, Carlos da Fonseca e Victor de Sá.

Em 1969 foi um dos presos e indiciados durante a repressão desencadeada pela ditadura militar contra os anarquistas do CEPJO, no Rio de Janeiro, como parte das repercussões do assassinato de Edson Luis. Continuou suas atividades clandestinamente, trabalhando pela reorganização do MLB no Rio de Janeiro. Colaborou ativamente com o Jornal O INIMIGO DO REI (1977-1983/4), com a reativação do Centro de Cultura Social de São Paulo (CCS-SP), participou do Congresso Anarkista de 1986, que decidiu romper com o sindicalismo oficial e a esquerda marxista e retomar o sindicalismo revolucionário através do Movimento Pela Reativação da COB-AIT – hoje com 22 anos de atividades e duas Federações reorganizadas. Nessa época, em conjunto com outros 11 militantes formaram o ‘Círculo e Arquivo Alfa’, que deveria ser o instrumento de suporte do Movimento Pela Reativação da COB-AIT e do próprio MLB (Movimento Libertário Brasileiro). Passados mais de 20 anos, com a morte de 10 dos fundadores originais, tentam se apossar de seu acervo – reunido com os acervos do Arquivo Alfa em São Paulo – expulsando-o, baseado em divergências políticas e calúnias que contra Edgar vem sendo lançadas injustamente!

Nas suas atividades de pesquisa percorreu o Brasil recolhendo depoimentos de militantes e seus descendentes, coletando documentos de importantes militantes operários e ativistas anarkistas, constituindo um acervo único da história social brasileira entre 1890 e 1940, da mesma forma como já o fizera em relação a história das lutas operárias e do anarkismo e do anarcosindicalismo em Portugal. Sendo até hoje usa obra “Os Companheiros”, em cinco volumes, que reúne as biografias de militantes e ativistas no Brasil, como o ÚNICO DICIONÁRIO BIOGRÁFICO do Movimento Operário Brasileiro, já escrito até hoje.

Em 1999 publicou o livro “Universo Acrata”, em dois volumes, uma história do MLP do Movimento Libertário Internacional, trabalho de atualização das pesquisas de Max Netlau no final do século XIX.

Em duas de suas obras debate com o MLB (Movimento Libertário Brasileiro),mostrando as divergências dentro deste no transcurso dos anos e das lutas contra a ditadura militar, “Três Depoimentos Libertários” e “Lembranças Incompletas”, onde se colcoa contra o academicismo e o reformismo esquerdizante que se foi infiltrando nas fileiras libertárias

BIBLIOGRAFIA DE EDGAR RODRIGUES

- Na Inquisição de Salazar. Rio de Janeiro: 1957.
- A Fome em Portugal. Rio de Janeiro: 1958.
- Portugal Hoy. Caracas: 1963.
- Socialismo e Sindicalismo no Brasil. Rio de Janeiro: Laemmert, 1969.
- Nacionalismo e Cultura Social. Rio de Janeiro: Laemmert,1972.
- Novos Rumos, Rio de Janeiro: Mundo Livre, 1972.
- ABC do Anarquismo. Lisboa: Assírio e Alvim, 1976.
- Breve História das Lutas Sociais em Portugal. Lisboa: Assírio e Alvim, 1977.
- Deus Vermelho. Porto: S/E, 1978.
- Alvorada Operária. Rio de Janeiro: Mundo Livre, 1979.
- Socialismo: Uma Visão Alfabética. Rio de Janeiro: Porta Aberta, 1980.
- O Despertar Operário em Portugal. Lisboa: Sementeira, Lisboa, 1980.
- Os Anarquistas e os Sindicatos. Lisboa: Sementeira, 1981.
- A Resistência Anarco-Sindicalista em Portugal. Lisboa: Sementeira, 1981.
- A Oposição Libertária à Ditadura. Lisboa: Sementeira, 1982.
- Lavoratori italiani in Brasil. Itália: Galzerano Editore, 1985.
-ABC do Sindicalismo Revolucionário. Rio de Janeiro: Achiamé Editora, 1987.
-Os Libertários. Petrópolis: Vozes, 1988.
-Os Anarquistas, Trabalhadores Italianos no Brasil. São Paulo: Global Editora, 1989.
-O Anarquismo no Teatro, na Escola e na Poesia. Rio de Janeiro: Achiamé Editora, 1992.
-Quem Tem Medo do Anarquismo? Rio de Janeiro: Achiamé Editora, 1992.
-Entre Ditaduras. Rio de Janeiro: Achiamé Editora, 1993.
-O Ressurgir do Anarquismo. Rio de Janeiro: Achiamé Editora, 1993.
-A Nova Aurora Libertária. Rio de Janeiro: Achiamé Editora, 1993.
-Os Libertários. Rio de Janeiro: VJR Editores, 1993.
-O Homem em Busca da Terra Livre. Rio de Janeiro: VJR Editores, 1993.
-O Anarquismo no Banco dos Réus. Rio de Janeiro: VJR Editores, 1993.
-Os Companheiros 1. Rio de Janeiro: VJR Editores, 1994.
-Os Companheiros 2. Rio de Janeiro: VJR Editores, 1995.
- Diga Não à Violência. Rio de Janeiro: VJR Editores, 1995.
- Pequena História da Imprensa Social no Brasil, Florianópolis, Editora Insular, 1997.
- Os Companheiros 3. Florianópolis: Insular, 1997.
- Os Companheiros 4. Florianópolis: Insular, 1997.
- Os Companheiros 5. Florianópolis: Insular, 1997.
- Notas e Comentários Histórico-Sociais. Rio de Janeiro: CC&P Editores, 1998.
- O Universo Ácrata (Vol. I e II). Florianópolis: Insular, 1999.
- Pequeno Dicionário das Idéias Libertárias. Rio de Janeiro: CC&P Editores, 1999.
- Anarquismo à Moda Antiga. Rio de Janeiro: Achiamé, 2001.
-
O Homem e a Terra no Brasil. Rio de Janeiro: CC&P Editores, 2001.
- O Porto Rebelde. Porto. Editor Fernando Vieira, 2001.
- Três Depoimentos Libertários. Rio de janeiro: Achiame Editora, 2002.
- Agaisnt All Tyranny – essay on Anarchism in Brazil. Londres-Inglaterra. Kate Sharpley Library, 2003.
- Socialismo: Síntese das Origens e Doutrinas. Rio de Janeiro. Editora Porta Aberta, 2003 (2ª edição).
- Rebeldias-Volume 1. Rio de janeiro. Achiamé Editora, 2003.
- -ABC do Sindicalismo Revolucionário. Rio de Janeiro: Achiamé Editora, 1987.
- Rebeldias-Volume 2. Santos, Brasil. Editora Opúsculo Libertário, 2004.
- Anarquismo à Moda Antiga. Achiamé Editora, 2005.
- Um Século de História Político-Social em Documentos-Volume 1. Rio de Janeiro, Achiamé Editora, 2005.
- Rebeldias-Volume 3. Santos, Brasil. Editora Opúsculo Libertário, 2005.
- Socialismo: Síntese das Origens e Doutrinas. Rio de Janeiro. Achiamé Editora, 2006 (3ª edição).
- Um Século de História Político-Social em Documentos-Volume 2. Rio de Janeiro. Achiamé Editora, 2007.
- Lembranças Incompletas. Guarujá, SP-Brasil. Editora Opúsculo Libertário, 2007.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Maurício Tragtenberg


Sessenta e nove anos de vida foram insuficientes para que o Brasil avaliasse a jóia intelectual que detinha. Maurício Tragtenberg, filósofo e cientista político, destacou-se como um grande pensador brasileiro. Que o diga seu amigo, o jornalista e crítico de arte Antonio Candido. "Maurício Tragtenberg é reconhecido nas ciências sociais, mas poderia ter atuado em qualquer ciência humana".


O Prof. Dr. Antônio Ozaí da Silva, da Universidade Estadual de Maringá (UEM), que estuda há seis anos a produção de Tragtenberg, corrobora a opinião de Cândido e vai além: "Maurício foi um exemplo de cientista, professor e pesquisador. A dúvida e o espírito crítico eram seus companheiros". Para buscar soluções é que Tragtenberg lia ininterruptamente.


Tornou-se um acadêmico mesmo tendo estudado somente até a terceira série do ensino fundamental. Foi autodidata, um apaixonado por livros tantos clássicos como obscuros da literatura e da área de humanidades, que devorava na biblioteca municipal Mário de Andrade, em São Paulo e em sebos.

Curiosamente, despertou seu gosto pela leitura a convite do intelectual brasileiro Florestan Fernandes, que lhe apresentou uma obra de Max Weber quando trabalhavam no Café Pinguim durante a década de 1930, este como garçom e outro como faxineiro. Antônio Ozaí conta que Tragtenberg chegou a dilemas como comprar um livro ou uma calça. Optou pela calça e se arrependeu, quando não mais viu o exemplar na prateleira do sebo.


A compulsão pela palavra escrita somada à facilidade de guardar nomes e citações, fizeram-no ser lembrado por um saber enciclopédico. Para a Profª. Drª. Dóris Accioly e Silva, da UNESP de Marília, e co-organizadora da biografia de Maurício Tragtenberg, o vasto conhecimento do filósofo era presenciado em sala de aula. "Ele não era popular entre os alunos. Falava muito, citava bastante gente e não seguia ordem cronológica nas explicações".

O sociólogo Paulo Roberto de Almeida, membro de um grupo de estudos sobre a obra de Tragtenberg na UEM, foi uma exceção dentre os discentes. Ele relata em um artigo na revista Espaço Acadêmico sua convivência próxima com o professor. "Ele sempre será meu guru intelectual. Adorava suas aulas, sempre pouco frequentadas. Parece piegas, mas ele tinha o dom de cativar as pessoas pelo pensamento". Paulo Roberto também lembra do vício incontrolável do fumo e da distração do mestre. "Esperávamos pelo dia em que ele fumaria o giz e escreveria com os cigarros".


"Fugir dos relatos da vida acadêmica do filósofo para tentar entender Maurício é impossível", confirma a viúva Beatriz Tragtenberg. "Aquele homem era feito de idéias e palavras. Sem elas não viveria, não poderia respirar". O próprio professor confirmou isso, ao colocar a seguinte frase no texto à reitoria da UNICAMP, a fim de realizar concurso para titular da cadeira de Teoria das Organizações: "O que sou é o que me faz viver" (Shakespeare, Henrique VIII). Beatriz recorda com sorrisos do marido.

Adorava o jeito brincalhão e cínico dele e a sua simplicidade. Segundo ela, bastavam ao esposo a filha Lucila Tragtenberg, alguns livros e a companhia da mulher. "Ele fazia questão de me descrever como um apoio para suas inquietações".


Maurício é filho de imigrantes ucranianos, fugitivos da Europa por perseguições políticas. Nasceu em 1929, na cidade de Getúlio Vargas, interior do Rio Grande do Sul. A experiência de crescer entre os camponeses e pequenos donos de terra teve forte relação com seu pensamento anárquico-marxista. Na comunida de camponeses havia uma ajuda mútua entre os indivíduos, sem mestres e aprendizes.

Tragtenberg não acreditava em verdades reveladas, nem em instituições, mas via o questionamento de qualquer autoridade e regra como algo essencial para a formação de uma sociedade justa. "Ele busca sempre um jeito de dizer que era um judeu ateu. Não seguia normas. Só as interrogava", como lembra Sônia Marrach.

Após a perda do pai, mudou-se com sua mãe para São Paulo, onde começou a trabalhar ainda pequeno. Conviveu com operários estrangeiros e participou do Partido Comunista Brasileiro (PCB), do qual foi expulso por refutar o stalinismo. Foi também muito amigo da família Abramo, com quem desenvolveu suas críticas à sociedade capitalista. Ingressou no curso de Ciências Sociais da USP, cursando apenas um ano. Posteriormente, formou-se em História pela mesma universidade.


Um traço muito comentado sobre o intelectual é sua preocupação com a justiça e a igualdade social. Escreveu muitas páginas a respeito dos caminhos a serem seguidos para que fosse construído um país melhor.

Dois pontos se destacaram: o primeiro, muito corrente em suas aulas, era estimular as pessoas a pensarem criticamente, a dialogarem umas com as outras na busca constante por respostas mais apuradas; o segundo era a estrutura de ensino nas universidades (e nas escolas de um modo geral), que não deveria ser uma perpetuação do sistema de dominação capitalista, mas uma libertação do pensamento e da ação do homem.

Tragtenberg ficou conhecido pela pregação que fazia da coerência
entre teoria e prática. "Ele combatia o academicismo mórbido. Se a teoria existia, devia ser para melhorar a vida das pessoas", afirma Antônio Ozaí .


Ninguém melhor que Maurício para comprovar a dificuldade de se enfrentar o sistema dominante. Quando os militares tomaram o poder no Brasil, o professor foi confinado à aulas de História Geral para o ensino médio. Seu grau de conhecimento o levou ao ensino superior, tendo lecionado na USP, UNICAMP e FGV. Escreveu artigos nos jornais Folha de S.Paulo e Notícias Populares, neste, contrariando as críticas contra sua integridade. "Foi rejeitado por muitos acadêmicos quando publicava no NP. Diziam que havia se vendido", conta Dóris Accioly.


Porém, para Tragtenberg, escrever em um jornal popular e sensacionalista representava quebrar com o ideal de mídia séria e honesta de alguns veículos. Afinal, "todos têm suas glórias e máscaras", como lembra Antônio Cândido. Com isso, o filósofo afirmava sua integridade ética e sua honra, porque não se moldava à situação para se privilegiar, mas buscava meios de defender seus ideais.


Maurício Tragtenberg foi uma figura que, assim como o filósofo alemão Nietszche, não foram compreendidos plenamente em seu tempo, mas que, sem dúvida, fazem parte do entendimento da sociedade em que hoje vivemos. Maurício não foi daqueles personagens que o nome inspira emoção e o sobrenome razão. Foi o que sempre foi em qualquer lugar e momento: humor auto-depreciativo, firme em suas convicções, mas sempre receptivo a reformular seus saberes, marxista que era, e fanático por estudar e ler.


Fonte: http://www.facasper.com.br/cultura/site/ensaio.php?tabela=&id=154

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

O paradoxo andante - Por Eduardo Galeano

O texto abaixo, do jornalista e escritor uruguaio Eduardo Galeano, foi publicado originalmente no jornal argentino Página 12.

Dentro em breve será publicado um livro meu chamado ''Espejos''. É algo assim como uma história universal, e desculpem o atrevimento. ''Posso resistir a tudo, menos à tentação'', dizia Oscar Wilde, e confesso que sucumbi à tentação de contar alguns episódios da aventura humana no mundo do ponto de vista dos que não saíram na foto. Pode-se dizer que não se trata de fatos muito conhecidos. Aqui resumo alguns, apenas uns poucos.

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Quando foram desalojados do Paraíso, Adão e Eva mudaram-se para África, não para Paris.
Algum tempo depois, quando seus filhos já se haviam lançado pelos caminhos do mundo, foi inventada a escrita. No Iraque, não no Texas.
Também a álgebra foi inventada no Iraque. Foi fundada por Mohamed al Jwarizmi , há 120 anos, e as palavras algoritmo e algarismo derivam do seu nome.
Os nomes costumam não coincidir com o que nomeiam. No British Museum, por exemplo, as esculturas do Partenon chamam-se ''mármores de Elgin'', mas são mármores de Fídias. Elgin era o nome do inglês que as vendeu ao museu.

As três novidades que tornaram possível o Renascimento europeu – a bússola, a pólvora e a imprensa – haviam sido inventadas pelos chineses, que também inventaram quase tudo o que a Europa reinventou.

Os hindus souberam antes de todos que a Terra era redonda e os maias haviam criado o calendário mais exato de todos os tempos.

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Em 1493, o Vaticano presenteou a América à Espanha e obsequiou a África negra a Portugal, ''para que as nações bárbaras sejam reduzidas à fé católica''. Naquele tempo a América tinha quinze vezes mais habitantes que a Espanha e a África negra cem vezes mais que Portugal. Tal como havia mandado o Papa, as nações bárbaras foram reduzidas. E muito.

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Tenochtitlán, o centro do império azteca, era de água. Hernán Cortés demoliu a cidade pedra por pedra e, com os escombros, tapou os canais por onde navegavam 200 mil canoas. Esta foi a primeira guerra da água na América. Agora Tenochtitlán chama-se Cidade do México. Por onde corria a água, agora correm os automóveis.

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O monumento mais alto da Argentina foi erguido em homenagem ao general Roca, que no século 19 exterminou os índios da Patagônia.
A avenida mais longa do Uruguai tem o nome do general Rivera, que no século 19 exterminou os últimos índios charruas.

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John Locke, o filósofo da liberdade, era acionista da Royal Africa Company, que comprava e vendia escravos.
No momento em que nascia o século 18, o primeiro dos bourbons, Felipe V, estreou o seu trono assinando um contrato com o seu primo, o rei da França, para que a Compagnie de Guinée vendesse negros na América. Cada monarca ficava com 25% dos lucros.
Nomes de alguns navios negreiros: Voltaire, Rousseau, Jesus, Esperança, Igualdade, Amizade.
Dois dos Pais Fundadores dos Estados Unidos desvaneceram-se na névoa da história oficial. Ninguém se recorda de Robert Carter nem de Gouverner Morris. A amnésia recompensou os seus atos. Carter foi a única personalidade eminente da independência que libertou seus escravos. Morris, redator da Constituição, opôs-se à cláusula estabelecendo que um escravo equivalia às três quintas partes de uma pessoa.

''O nascimento de uma nação'' , a primeira super-produção de Hollywood, foi estreado em 1915, na Casa Branca. O presidente, Woodrow Wilson, aplaudiu-a de pé. Ele era o autor dos textos do filme, um hino racista de louvação à Ku Klux Klan.

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Algumas datas: Desde o ano 1234, e durante os sete séculos seguintes, a Igreja Católica proibiu que as mulheres cantassem nos templos. As suas vozes eram impuras, devido àquele caso da Eva e do pecado original.
No ano de 1783, o rei da Espanha decretou que não eram desonrosos os trabalhos manuais, os chamados ''ofícios vis'', que até então implicavam a perda da fidalguia.
Até o ano de 1986 foi legal o castigo das crianças, nas escolas da Inglaterra, com correias, varas e porretes.
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Em nome da liberdade, da igualdade e da fraternidade, em 1793 a Revolução Francesa proclamou a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. A militante revolucionária Olympia de Gouges propõe então a Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã. A guilhotina cortou-lhe a cabeça.
Meio século depois, outro governo revolucionário, durante a Primeira Comuna de Paris, proclamou o sufrágio universal. Ao mesmo tempo, negou o direito de voto às mulheres, por unanimidade menos um: 899 votos conta, um a favor.

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A imperatriz cristã Teodora nunca disse ser uma revolucionária, nem nada que se parecesse. Mas há 1500 anos o império bizantino foi, graças a ela, o primeiro lugar do mundo onde o aborto e o divórcio foram direitos das mulheres.
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O general Ulisses Grant, vencedor da guerra do Norte industrial contra o Sul escravocrata, foi a seguir presidente dos Estados Unidos. Em 1875, respondendo às pressões britânicas, respondeu: ''Dentro de 200 anos, quando tivermos obtido do protecionismo tudo o que ele nos pode proporcionar, nós também adotaremos a liberdade de comércio''. Assim, pois, em 2075 o país mais protecionista do mundo adotará a liberdade de comércio.
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'Botinzito'' foi o primeiro cão pequinês que chegou à Europa. Viajou para Londres em 1860. Os ingleses batizaram-no assim porque era parte do botim extorquido à China no fim das longas guerras do ópio. Vitória, a rainha narcotraficante, havia imposto o ópio a tiros de canhão. A China foi convertida num país de drogados, em nome da liberdade, a liberdade de comércio.
Em nome da liberdade, a liberdade de comércio, o Paraguai foi aniquilado em 1870. Ao cabo de uma guerra de cinco anos, este país, o único das Américas que não devia um centavo a ninguém, inaugurou a sua dívida externa. Às suas ruínas fumegantes chegou, vindo de Londres, o primeiro empréstimo. Foi destinado a pagar uma enorme indenização ao Brasil, Argentina e Uruguai. O país assassinado pagou aos países assassinos, pelo trabalho que haviam tido a assassiná-lo
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O Haiti também pagou uma enorme indenização. Desde que, em 1804, conquistou a sua independência, a nova nação arrasada teve que pagar à França uma fortuna, durante um século e meio, para espiar o pecado da sua liberdade.
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As grandes empresas têm direitos humanos nos Estados Unidos. Em 1886, a Suprema Corte de Justiça estendeu os direitos humanos às corporações privadas, e assim continua a ser. Poucos anos depois, em defesa dos direitos humanos das suas empresas, os Estados Unidos invadiram dez países, em diversos mares do mundo.
Mark Twain, dirigente da Liga Antiimperialista, propôs então uma nova bandeira, com caveirinhas em lugar de estrelas. E outro escritor, Ambroce Bierce, confirmou: ''A guerra é o caminho escolhido por Deus para nos ensinar geografia''.
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Os campos de concentração nasceram na África. Os ingleses iniciaram o experimento, e os alemães desenvolveram-no. Depois disso, Hermann Göring aplicou na Alemanha o modelo que o seu papa havia ensaiado, em 1904, na Namíbia. Os professores de Joseph Mengele haviam estudado, no campo de concentração da Namíbia, a anatomia das raças inferiores. As cobaias eram todas negras.
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Em 1936, o Comitê Olímpico Internacional não tolerava insolências. Nas Olimpíadas de 1936, organizadas por Hitler, a seleção de futebol do Peru derrotou por 4 a 2 a seleção da Áustria, o país natal do Führer. O Comitê Olímpico anulou a partida.
A Hitler não lhe faltaram amigos. A Rockefeller Foundation financiou investigações raciais e racistas da medicina nazi. A Coca-Cola inventou a Fanta, em plena guerra, para o mercado alemão. A IBM tornou possível a identificação e classificação dos judeus, e essa foi a primeira façanha em grande escala do sistema de cartões perfurados.
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Em 1953, estourou o protesto operário na Alemanha comunista. Os trabalhadores se lançaram às ruas e os tanques soviéticos se ocuparam de calar-lhes a boca. Então Bertol Brecht propôs: ''não seria mais fácil o governo dissolver o povo e eleger outro?''
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Operações de marketing. A opinião pública é o target. As guerras de vendem mentindo, como se vendem os carros.
Em 1964, os EUA invadiram o Vietnã, pois o Vietnã havia atacado dois barcos dos EUA no golfo de Tonkin. Quando a guerra havia destruído uma multidão de vietnamistas, o ministro da Defesa, Robert McNamara, reconheceu que o ataque de Tonkin não havia existido. Quarenta anos depois, a história se repetiu no Iraque.
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Milhares de anos antes de que a invasão norte-americana levasse a civilização ao Iraque, nessa terra bárbara havia nascido o primeiro poema de amor da história universal. Em língua sumeria, escrito no barro, o poema narrou o encontro de uma deusa e um pastor. Inanna, a deusa, amou essa noite como se fosse mortal. Dumuzi, o pastor, foi imortal enquanto durou essa noite.
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Paradoxos andantes, paradoxos estimulantes: Aleijadinho, o homem mais feio do Brasil, criou as mais lindas esculturas da era colonial americana.
O livro de viagens de Marco Polo, ''Aventura da liberdade'', foi escrito na prisão de Gênova.
"Don Quixote de La Mancha", outra aventura de liberdade, nasceu na prisão de Sevilla.
Foram netos de escravos, os negros que criaram o jazz, a mais livre das músicas.

Um dos melhores violinistas de jazz, o cigano Django Reinhardt, tinha não mais do que dois dedos em sua mão esquerda.Não tinha mãos Grimod de la Reynière, o grande mestre da cozinha francesa. Com ganchos escrevia, cozinhava e comia.

A Filha do Patrão - de Artur de Azevedo

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Ser humano

Ser humano...

...Descubro na certeza dos limites de meus cansados sentidos que ser humano nos sofridos dias atuais é assumir um estatuto todo diferenciado e bem distinto. Nunca o sentido da humanidade, mostrou seu traço de mais profunda marca com tamanha latência.
Se sabe que onde existe sede, se carece de água. Água boa, pura, potável, possível.
Da mesma forma que onde impera fome, não há outra saída... O corpo pede comida. Que seja boa, viva em vida e que alimente os limites do corpo, da existência, da essência. A água, o alimento para a humanidade que cabe no tempo presente tem nome e é expresso no claro desafio de superarmos todas as formas de preconceito. Ser humano é lutar contra todos as formas de preconceito. É assumir-se como parte do problema e parte da solução, é mirar-se no horizonte a ser transformado e transmudado.
Ser humano é o não-ser convencional. É romper com os valores que são funcionais a tudo o que vivemos e não queremos viver.
Ser humano é não ser o que se é.
É ser mais... É não se admitir como tal e projetar-se, enfim, livre da maldade silenciosa do tempo que nos toma a alma.

Ser humano é isso!

Um deleite: Silvio Rodriguez

sábado, 19 de janeiro de 2008